segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Programa de Dilma troca foco macro por agenda microeconômica

Um eventual governo da candidata do PT à Presidência, a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil), irá se concentrar em uma ampla agenda de mudanças na microeconomia, no lugar de profundas alterações nos fundamentos macroeconômicos. A análise dos petistas que discutem com Dilma os rumos da política econômica a partir de 2011 é de que os resultados positivos obtidos no segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva devem servir como parâmetro para não haver rupturas ou inflexões abruptas no tripé formado pelo superávit primário, metas de inflação e câmbio flutuante.

O grupo petista avalia que os fundamentos macroeconômicos devem ser um meio para o governo atingir os seus objetivos - crescimento do PIB, inclusão social, geração de emprego e redução das vulnerabilidades externas - e não o próprio objetivo, como acontecia, segundo eles, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Esse modelo, inclusive, já teria sua formulação iniciada na atual gestão. Dois exemplos disso são mencionados: a retirada dos investimentos do PAC do cálculo do superávit e a opção por sempre escolher a margem superior da meta de inflação como cálculo para o crescimento.

Assim, a prioridade será a microeconomia, utilizada para que os ganhos atuais sejam preservados e os resultados futuros aprofundados.

A principal meta é tornar consistente a taxa de investimento dos setores público e privado e fazer com que esses investimentos possam ser planejados a longo prazo, de modo que atendam às demandas dos grandes eventos esportivos que o país sediará, como Copa do Mundo e Olimpíada, e financiem a exploração das camadas do pré-sal, além de permitir que o país ingresse e se sustente no rol dos países mais desenvolvidos do mundo.

O grupo é formado, entre outros, pelos ministros Paulo Bernardo (Planejamento) e Guido Mantega (Fazenda); o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa; o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli; o ex-ministro da Fazenda e deputado federal Antonio Palocci; o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, e o ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel. Oficialmente, eles ainda não formam um comitê de política econômica da pré-campanha, mas são os mais ouvidos, tanto por Dilma quanto pelo presidente da República, quando a discussão envolve o futuro do país.

A ausência de representantes do Banco Central, e principalmente de seu presidente, Henrique Meirelles, filiado ao PMDB (ele está no grupo que estuda o programa do PMDB), não significa que o órgão perderá autonomia em um eventual governo Dilma, mas a tendência é de que, no futuro, o BC se concentre cada vez mais na política monetária.

Integrantes do grupo petista rejeitam críticas recentes dos aliados e da oposição que consideram a plataforma econômica de Dilma estatizante. O "fortalecimento do Estado", segundo explicam, seria dar protagonismo ao Estado naquelas iniciativas microeconômicas, mas respeitando os fundamentos macroeconômicos.

O melhor exemplo disso é a reforma tributária, primeiro item da agenda legislativa para 2011, uma das mais antigas reformas em tramitação no Legislativo e que sempre esbarra na resistência dos Estados e na falta de disposição da União em abrir mão de receitas.

Com o real valorizado dentro de um sistema com câmbio flutuante, os petistas planejam desonerar tributos que prejudicam os exportadores, como o IPI e o ICMS. "É mais fácil tentar resolver o problema do câmbio valorizado por uma reforma tributária. Nosso sistema, na prática, impede a efetiva desoneração das exportações e dos investimentos. A reforma tributária vai permitir desonerar isso", afirmou o ministro Paulo Bernardo.

O ministro afirma que isso decorre de um pedido do presidente para que seja efetuado um amplo planejamento de investimentos de longo prazo no país. E cita um ponto em debate no partido que deve ser implementado ainda neste ano: um setor para avaliar os projetos de investimento.

"No PAC, estamos apanhando muito por conta de projetos malfeitos, feitos às pressas, ou antigos com tinta nova. O presidente determinou que criemos uma espécie de birô para supervisionar todos os projetos. Vamos montar um corpo técnico para acompanhar isso, o que vai eliminar muita polêmica com o Tribunal de Contas da União", disse.

O PT pensa também em fortalecer o papel dos fundos de pensão públicos e ampliar a participação dos fundos de pensão privados nos investimentos de infraestrutura. O Estado deverá incentivar as grandes empresas brasileiras que têm se tornado líderes em seus setores no mercado mundial para formarem fundos de pensão próprios com grande capacidade de investimento em infraestrutura e logística, assim como os fundos estatais adquiriram nos últimos anos. "É um capital onde o trabalhador participa da propriedade, da gestão e do resultado. Temos que estimular para que os patrões coloquem isso na mesa de negociação com seus empregados", afirma o senador Aloizio Mercadante (SP), um dos formuladores dos programas econômicos do PT em todas as eleições presidenciais do partido.

Nesse sentido, o papel da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), criada neste ano, corrobora essa tese. Ela tende a ser uma das mais importantes agências reguladoras do novo governo, que tem interesse em aprovar no Congresso, também em 2011, um marco regulatório do setor, no qual os ministérios ficariam como definidores das diretrizes do setor.

Em artigo publicado no site do PT, o ex-presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, defende a viabilização de "amplos fundos capazes de articular as distintas fontes de recursos disponíveis no cenário brasileiro. Às atuais fontes de recursos (FAT, FGTS, poupança, Tesouro, etc.), deveriam ser articulados tanto um menor estímulo à aquisição de títulos públicos e a busca de uma maior participação dos bancos privados, quanto os recursos dos fundos de pensão, dos fundos de investimentos nacionais e estrangeiros, das agências multilaterais e do mercado de capitais", diz o texto, intitulado "Os Desafios do Investimento".

A reforma do Estado também tende a ser outro ponto a ser trabalhado. Mercadante defende que o Estado, por meio do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e em associação com o Tribunal de Contas da União (TCU), imponha um sistema de metas de resultado e de padrões de eficiência. "Temos que trazer para o Estado parte da eficiência da gestão das empresas privadas", afirma, mencionando os contratos de gestão firmados entre as instituição públicas e suas unidades administrativas como uma prática bem-sucedida em alguns ministérios.(Valor Econômico)

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